As dobradiças enferrujadas ressoavam a chegada de mais um dia chuvoso. Elas enfeitam a casa com as fotografias das viagens, pôr do sol, feira livre, mar, avião enfeitam as paredes da sala. A casa tem a alegria de seus paladares, dados às novidades do mundo. A cozinha é a festa das cores, panelas e talheres colorem o ambiente de azulejos azuis, imitando os azulejos portugueses, que na primeira vigem à Salvador elas viram a enfeitar o terminal marítimo.
Os livros, prazeirosamente lidos, encontram-se por toda a parte da casa: criado mudo, gavetas, estante, mesas. Um grande mapa do Brasil decora o parede do quarto, colorido de marca-texto rosa,ele guarda o itinerário dos caminhos percorridos juntos. A velhice é uma alegria como fora sempre o encontro das duas, cuidam-se com a alegria e o espanto dos versos orvalhados de Manoel de Barros. A cebola, o gengibre, a canela, o açúcar e o cravo são os cheiros dos feriados em que não viajam, durante horas a cozinha respira a ternura da mistura quente das ervas e doces. No quintal um imponente mandacaru se exibe soberbo em sua natureza bruta de espinho e verde. A rede laranja balança nas tardes ociosas. Quando é noite de lua cheia, as duas sentam-se na varanda e, ao som cadente dos afro-sambas de Vinícius, sentem o almíscar gelado e ardido que a ventania traz do mar.
Entardecem vendo o espetáculo das tarrafas abraçando o mar.
A casa é um encontro, dos sapatos, das malas sempre prontas às novas descobertas de pedaços de mundo.
Elas zelam a saúde da palavra e seus silêncios também são gestos ternos, horas no silêncio de uma rede,no encantamento curvilíneo do corpo. As manhãs se erguem soberbas de luz e calor, mais à frente o mar em todo o seu mistério e força agita-se brilhante como peixes miúdos dentro de uma rede.
A casa é mais que paredes e cores, ela transborda vida, elas sabem.
Uma casa repleta de vozes. Vozes de amor.
ResponderExcluirBonito de ler e imaginar.