segunda-feira, 23 de julho de 2012

a DEPRESSÃO PÓS-PARTO - por Vinicius Linné

o14, 2012 - Bartosz

Uma ponta branca no peito. Uma pústula posta entre os pelos - estes pretos. O estranhamento de ter em ti o que não te faz parte. Não é meu isso. É vivo. E me habita.

Os dedos de unhas sujas a apertarem de dor e dilaceramento a pústula. E eis o parto. 

O verme é o parto do homem.

É pela dor que se expele a vida não tua, mas que foi em ti gerada, de ti nutrida e por ti parida. Branco e gordo. Cego e liso. Boca ainda aberta deixando escorrer teu sangue e tua carne. 

Não choca o verme. Verme de se estraçalhar nos dentes. De se estourar na boca. De se comer porque um dia também ele te comeu. Lento. Silencioso. Farto verme.

Mas tu não comes o verme. Que pai seria se o fizesse? Antes joga-o descarga abaixo, ca-ri-nho-sa-men-te.

Depois, consternado, olha para o peito. Um buraco. Teu corpo sente a perda do verme. Soluça sangue. Rombo feito, peito abeto. Vazio por dentro. Sem o verme tu te tornas menos completo. Menos homem. Menos tu. 

Pariste. E secretamente te deu prazer o verme ao sair. O alívio de ser novamente tu, só tu, sem ninguém a te habitar. A satisfação de se ver livre do que inospitamente se embrenhou nas tuas carnes. O suspiro pleno da dor ao cessar... Passou. O verme havia saído. Sua boca havia aberto, largando o músculo ao qual se agarrava com terror de morte. Ufa.

Parido o verme ficou tu, o homem. E que carga é ser homem. Só homem, sem verme que lhe coma a solidão.

Ligeiros os teus dedos se embrenham nos pelos, já disse que pretos. Correm cutucando saliências, procurando novas pústulas, mais pontas brancas, outros vermes a poder parir. Mas outros não há.

Não ainda. Não na superfície. Não despontando do meio exato entre os teus mamilos.

Eles ainda tardarão a surgir. Poderão demorar no percorrer do caminho até a pele. Por enquanto ainda tomam força e forma. Ainda criam dentes e visgo. Ainda se alimentam, silentes, arrancando fibra a firba cada pedaço do teu já putrefato coração.

Um comentário:

  1. O alívio do parto, do peso, da febre...
    A solidão do vazio. A companhia da ausência formada, tomada, invadida.
    Somos assim, repletos de partos, depressões e tentativas oblíquas.

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