terça-feira, 12 de novembro de 2013

lARANJA - por Adilma Secundo Alencar.

Ela mudou de cidade e fez um pacto de amor com seu próprio corpo, com sua luz. Vivera muito tempo querendo tudo que era oferecido, a casa, o emprego, a vida par. Mas uma inundação de beleza invadiu seu gosto. Agora ela assumia sua própria loucura, é caro viver assim. A vida dela segue devagar e simples. Não sabe cuidar da casa. Passa horas olhando o céu, o asfalto quente, as mulheres pintadas, os homens barbudos, as cores frias do inverno. Dedica seu silêncio e seu afeto ao primeiro sorriso amigo que lhe oferece colo, cama, calma. Ela também dói. Antes não sabia dar esse afeto largo que seus olhos pingam, antes temia a ilusão, hoje só acredita nela, é tudo ilusão. Escolheu a mais cara e mais colorida, a quase loucura de tardes alaranjadas embaixo das árvores sadias e sós. Sangrou pelos olhos com um amor que lhe imprimiu a eternidade nos dentes, no suor, na comida,no filho que não teve, vive assim prenhe de perfume e delicadeza. Ela procura é repouso para esse tanto de amor, e encontra nos bons dias de olhos calmos e grandes. Nas noites que além do corpo está à luz, regada a desejo e fome. É de água e sol, porque não condiciona o gosto, não evita a dúvida de querer bem.
Ela não tem par, não tem páramo. Desfila dúvida e um milhão de feixes solares, a tristeza não dura, porque ela sabe cozinhar massas, sabe fazer doces, sabe se sentar à mesa sem nódoas no peito, sabe comer como um bicho sabe comer, com prazer e com fome.
Cambaleia na multidão, vê o lirismo como a religião do seu corpo, os cartões, as cartas, os laços de gente. As crianças invadindo a grama, as crianças despindo Deus. É milagre e abismo essa beleza que ela enxerga. É quase cessar os ponteiros dos homens e se render às açucenas, aos girassóis.

Ela sabe dançar. E não tem tristeza que não derreta numa manhã como a de hoje, alaranjada.

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