Acendo um cigarro imaginário e desço uma rua
verdadeira. Troquei a palmilha dos meus sapatos. Estou mais alta.
Estou mais curvada. Estou envelhecendo rápido. Tenho fome de flores
e sede de nuvens. Estou caminhando para o fim do mundo sem mapa.
A mãe está cansada da quimioterapia. Estou
cansada de mim mesma. Sento no balcão da primeira padaria. Ainda não
é o fim do mundo. Estou na metade de um caminho desconhecido. Peço
um café de crenças com pouco açúcar e um pão nosso de cada dia.
Pouca manteiga. Não há fé no cardápio. Bendito seja quem
acredita. Os dias são apenas uma estatística. Nunca gostei de
matemática.
O café chega frio e duvidoso. O pão fala muitas
línguas. Mentiras e verdades são batidas com leite, farinha de
trigo e dúzias de ovos. Não reconheço onde estou. Minha boca não
sente mais o gosto de algumas certezas. A vida é uma pedra de
aspartame. Um experimento. Inúmeras probabilidades. Não consigo
interpretar todos os dados. Nunca gostei de matemática.
Sombras entram na padaria. Ossos humanos dividem o
mesmo balcão. Dúvidas coletivas se abraçam e recitam algum poema
sem sangue. Somos todos amigos.
Tiro meus óculos. Espelhos do céu refletem
minhas olheiras. Estou trocando de pele. Vou ser uma outra pessoa. A
padaria é uma das paradas para o fim do mundo. Um pedaço de pão e
um cálice de vinho. Estou na missa de sétimo dia das minhas
crenças. Ninguém recitou o pai-nosso. Somos todos amigos. Pão e
vinho. Café com leite. A padaria é uma igreja. Meu coração é um
templo vazio. Santificado seja o café, a hóstia e as novas
amizades.
"Amém".
Bom, muito bom, isso. Muito bom.
ResponderExcluirVocê é boa em frase-tapa: curta, rápida, certeira.
O melhor: nem dói.
Gostei, Huck.
Si,eu adoro suas letras.Saudade de você.
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