É incrível como o tempo passa, me disseram
outro dia, eu pensei em você, sei lá, de repente uma saudade besta de lhe
escrever cartas, eu adoro cartas, elas ficaram sem endereço quando você
partiu.Eu queria dizer aquelas coisas bobas, dizer que você fica linda de
sobretudo preto e batom claro ou de como aquela semana inteira longe quase me
mata. Queria que você soubesse que eu continuo vendo o mundo com aquele “jeito torto”
que você insistia em dizer que não era o melhor. Estou bebendo mais nos últimos
meses, mal fiquei em casa esse semestre. A moça da biblioteca pergunta por você
insistentemente e me olha com cara de interrogação quando pego livros de
filosofia, meu humor não lhe responde nada.
Semana passada eu quis ter um filho. Eu pensei em você, eu deixei de
pensar. Seríamos três. Seríamos tanto. Seríamos.
Exposições, shows, festivais, saraus têm preenchido o tempo, quando há
tempo. Você sabe de minha interrogação do bom senso, das construções que engessam.
No sábado, encontrei seu olhar dissolvido numa tela de um artista
famoso, eu que nada entendo de arte. Apartada das certezas dos espectadores da exposição,
desci até o Anhangabaú, entrei num bar sujo, desses que você nunca vai
conhecer. Bebi.
Caminhei junto com os sãos que transitavam pelo centro, que fazem
refeições regulares, transam com a regularidade de uma missa e são felizes em
seus corpos e casa.
Aprendi a fazer peixe grelhado. Eu sei que você gosta de peixe, mas só
agora aprendi.
Eu vou embora da cidade, eu queria que você soubesse. Se eu pudesse
escrever uma última carta, diria que eu vou ficar numa casa bonita com prateleiras
verdes pros meus livros de poesia. Com um balcão dividindo a cozinha da sala.
Ah, que eu estou lendo uma autora nova que lembra você de TPM, que você vai
gostar da nova coleção da risqué. Que eu descobri teorias semânticas e autoras
que pesquisam a retórica dos sentimentos. E que eu desconfio de tudo isso, mas
amo a novidade. Na universidade tem umas flores brancas que lembram suas mãos.
Continuo com minhas manias: andar por aí sozinha. Ontem fez uma tarde linda, eu quis dividir com você. Daria meu
olhar só pra você, você guardaria meu sorriso.
Às vezes você dói tão bonito que se eu dissesse ninguém acreditaria.
Eita moça, você tem um lirismo que é só seu. Gosto tanto que queria ter escrito (de novo). Você suspira leve. Xeros.
ResponderExcluirObrigada, moça das cerejas.Suspiro saudade, já "leve".
ExcluirTaí. O amor foi feito para ser narrado assim. O desamor também. Fica bonito.
ResponderExcluirObrigada pela leitura e comentário,Silmara.
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